quarta-feira, 11 de setembro de 2013

DA NATUREZA DOS CRIMES ELEITORAIS


Fávila Ribeiro, acerca da natureza dos crimes eleitorais, é bem enfático:

"Os crimes eleitorais compõem subdivisão dos crimes políticos. Entre nós, brasileiros, comportaria, presentemente, dividir os crimes políticos em duas categorias, estando a primeira ocupada pelos crimes militares ficando a segunda com os crimes eleitorais." (RIBEIRO, 1996, p. 554)

Ribeiro segue explicando que, apesar de que nenhuma das duas categorias de crimes políticos foi expressamente tida como tal pelo direito positivo, tecnicamente o caráter político delas somente se ajusta, inclusive estando, as duas, repartidas entre duas áreas jurisdicionais especializadas: a eleitoral e a militar. E acrescenta que a Constituição Federal, em seu artigo 129, dá competência aos juízes federais para processar e julgar os crimes políticos, ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral.

Porém, o maior argumento do professor Ribeiro para a inclusão dos crimes eleitorais como subdivisão dos crimes políticos vem adiante:

"A inclusão dos crimes eleitorais na esfera de especialização política não é apenas decorrente da atitude assumida pelo legislador pátrio, retirando-os do contexto do Código Penal, fazendo-os inserir em capítulo da codificação eleitoral, mas é devido a própria natureza dos crimes eleitorais, afetando diretamente as instituições representativas, estruturas básicas da organização política democrática, que impõe sejam reconhecidos como crimes políticos." (RIBEIRO, 1996, p. 554) (grifos nossos)

Como visto anteriormente, o Estado Democrático de Direito depende da legitimação dada pela soberania popular, que é exercida por meio da cidadania, no processo democrático do sufrágio popular. Um ataque a tal processo de legitimação das instituições representativas significa um ataque ao próprio Estado Democrático de Direito. Tal ataque mina seus fundamentos e o destitui da legitimidade necessária para sua própria existência. No testemunho do professor Ribeiro:

"No Estado organizado democraticamente, o primeiro e originário poder reside no povo, mais precisamente, no corpo de cidadãos que constitui o poder de sufrágio. Esse poder de sufrágio nos termos do caput do art. 14, da Constituição Federal, constitui o órgão político primário, pelo qual, de modo exclusivo, é exercida a soberania popular, para deliberar diretamente ou eleger representantes. Em qualquer das duas alternativas democráticas fica a legitimidade governamental a depender da manifestação do povo, considerado em sua expressão política, isto é, do corpo eleitoral." (RIBEIRO, 1996, p.554) (grifos nossos)

Como muito bem salientado pelo professor Ribeiro, o sufrágio popular se constitui no órgão político primário, de onde todo o corpo político deriva, se fundamenta e se legitima. O sufrágio popular é "a energia política que vai assegurar o funcionamento de instituições governamentais." (RIBEIRO, 1996, p. 555).

Percebe-se que não há como haver crime político maior do que o que ataca o próprio fundamento de um Estado. Ao atacar o processo eleitoral, ataca-se o próprio Estado em seu âmago. Mina-se suas forças, sua energia vital, sua capacidade de existir e se mover.[1]

De todo o exposto, não há que se chegar a outra conclusão senão a de que os crimes eleitorais se tratam de crimes políticos.



[1] Pertinentes à questão os seguintes depoimentos de Fávila Ribeiro sobre o pensamento de outros doutrinadores:

"Observa Adolphe Prins que, para caracterização dos crimes políticos, é necessáriodefinir a ordem política, a qual deverá ser considerada nos aspectos externo e interno. Do ponto de vista externo compreende a independência da nação, a integridade do território, as relações de uns Estados com outros. E no aspecto interno envolve a forma de governo, os poderes políticos e os direitos políticos dos cidadãos. Detendo-se, a seguir, sobre as infrações políticas contra a ordem interior, Prins assinala que se ocupam por um lado das que atentam contra a existência ou funcionamento  dos poderes políticos; e por outro, das que perturbam ou entravam a intervenção popular na formação dos seus poderes, afetando os direitos políticos dos cidadãos. (Adolphe Prins, Science Penale et Droit Positif, Paris, Bruylant-Cristophe & Cie, Ed., 1899, pp. 90-94.)" (RIBEIRO, 1996, p. 555)

"Nesse sentido ressalta Vicenzo Manzini que o crime eleitoral tem 'o caráter objetivamente político porque é desferido contra a personalidade do Estado e porque ofende a interesse político do cidadão, atingindo contemporãnea e prevalecentemente a interesse político do Estado' (Vincenzo Manzini, Tratado di Diritto Penale Italiano, Torino, Unione Tip. Ed. Toriniense, 1950, vol. IV, p. 549)" (RIBEIRO, 1996, p. 555)

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